Capítulo 10 do Livro Medicamentos Mortais

MEDICAMENTOS MORTAIS E CRIME ORGANIZADO

CONFLITOS DE INTERESSE EM AGÊNCIAS DE MEDICAMENTOS

Processos judiciais revelaram que as empresas farmacêuticas podem ocultar sérios danos dos remédios em seus documentos de modo que as agências de medicamentos nunca descubram.

Testar medicamentos deveria ser uma tarefa pública. Para saber se os benefícios são superiores aos riscos, os reguladores não fazem consulta pública, mas consultam pessoas da empresa que é proprietária do medicamento e especialistas, muitos dos quais têm conflitos de interesse financeiro com relação aos medicamentos que estão avaliando.

Ex: o regulador de medicamentos que ajudou a Nycomed a conseguir aprovação para uma pílula para emagrecer, Letigen, foi diretamente para um cargo sênior na empresa que iria comercializá-lo. Mais tarde foi retirado do mercado devido aos danos cardiovasculares que causava.

Ex: a agência dinamarquesa de medicamentos contratou a psiquiatra Bente Glenthøj para seu comitê de registros, que não apenas aconselha, mas também toma decisões sobre a aprovação de medicamentos. A agência de medicamentos defendeu-se dizendo que não era possível conseguir a expertise de que precisava a menos que aceitasse pessoas com conflito.

Em 2011, havia 1.201 psiquiatras registrados na Dinamarca e apenas 92 deles (8%) tinham permissão para trabalhar para uma empresa farmacêutica. A agência de medicamentos queria que acreditássemos que nenhum dos 1.109 psiquiatras restantes era qualificado. No entanto, o Ministério da Saúde concedeu a ela uma isenção da lei.

Insatisfação interna entre funcionários da FDA e população: Uma pesquisa demonstrou que 70% dos cientistas da FDA não têm certeza de que os produtos aprovados pela FDA sejam seguros e que 66% não confiam no monitoramento da FDA de segurança de medicamentos comercializados. Em uma pesquisa de opinião, 76% dos cidadãos estavam preocupados que a FDA não comunicava questões de segurança de maneira eficaz.

– 51% dos medicamentos têm mudanças de rótulo devido a descobertas após a comercialização

– 20% dos medicamentos recebem novas advertências destacadas

– mais de 1 em 20 é retirado do mercado

CORRUPÇÃO EM AGÊNCIAS DE MEDICAMENTOS:

Ex: Em 2012, a dinamarquesa Lundbeck e sua parceira japonesa Takeda submeteram o vortioxetina, um ISRS, para aprovação nos EUA. O campeão de vendas da Lundbeck, escitalopram, teve a patente expirada. Um porta-voz disse que a empresa receberia um pagamento no montante de 43 milhões de dólares da Takeda se a FDA aceitasse o medicamento.

No capítulo, há relatos de algumas pessoas que trabalharam na instituição falando de como eram orientadas por seus superiores a aprovarem regulações e medicamentos, com documentos muitas vezes contraditórios. Além de terem suas vidas pessoais ameaçadas, escritórios arrombados e computadores hackeados… “Acredito que também tenha documentação de falsificação de documentos, fraude, perjúrio e atividades ilegais disseminadas, inclusive manipulação de testemunhas e retaliação contra elas”.

https://youtu.be/KUKTm2xqwA0

A INSUPORTÁVEL LEVEZA DOS POLÍTICOS:

Ex: A indústria farmacêutica contribui para campanhas políticas e a maior parte do dinheiro vai para os republicanos. Entre 1998 e 2006, a indústria gastou 1,2 bilhão em lobby e contribuições políticas, e em 1994 os republicanos tentaram eliminar completamente a FDA e deixar a indústria farmacêutica regular a si própria.

Em 1988, apenas 4% dos medicamentos novos introduzidos no mercado mundial foram aprovados primeiro pela FDA; 10 anos mais tarde, eram 66%. No fim da década de 1990, a FDA estava aprovando mais de 80% das solicitações da indústria para produtos novos.

A probabilidade de que uma nova substância ativa aprovada entre 1995 e 2010 demonstrasse um problema de segurança grave após a aprovação era de 24%.

A aprovação de dispositivos médicos também deve estar envolvida em esquemas de corrupção entre a FDA e superiores: Uma revisão de 78 solicitações para dispositivos cardiovasculares que receberam aprovação pré-comercialização da FDA mostrou que apenas 27% dos estudos eram randomizados, 65% das solicitações eram baseadas em apenas 1 estudo e, em 31% dos estudos, o grupo-controle era retrospectivo, o que é um delineamento muito pobre que quase sempre favorece a nova intervenção. Além disso, a Suprema Corte dos EUA decidiu que os pacientes prejudicados por um dispositivo aprovado pela FDA não podem processar a empresa.

Outros questionamentos do item:

– Propagandas de fármacos com celebridades

– Uso de estratégias de marketing, como escolha da voz e tom

– Frases finais como: “Pergunte ao seu médico se Lyrica é apropriado para você”, “Você pode ter uma doença sobre a qual não sabe.”

– Quando os medicamentos passam do status de venda sob prescrição para sem prescrição, a informação sobre seus danos e contraindicações pode desaparecer.

REGULAÇÃO DE MEDICAMENTOS BASEADA NA CONFIANÇA:

Na década de 1990, havia a preocupação de que os beta agonistas de longa ação poderiam aumentar as mortes relacionadas à asma em vez de diminuí-las, e a FDA pediu que a GlaxoSmithKline realizasse um grande ensaio de salmeterol, o ensaio SMART. Os resultados do SMART confirmaram os resultados de um grande ensaio que a Glaxo tinha conduzido e publicado já em 1993: os beta agonistas de longa duração aumentam a mortalidade na asma.

O risco absoluto de morrer parece pequeno, apenas 1 paciente por 1.000 por ano de uso. Entretanto, o salmeterol era um dos medicamentos mais prescritos no mundo e o risco aumentado traduz-se em 4 a 5 mil mortes extras relacionadas à asma a cada ano apenas nos Estados Unidos. Mesmo assim, a atualização do GINA continua colocando os beta agonistas de longa duração como tratamento padrão da asma.

Dois dos cinco autores do SMART eram funcionários da Glaxo e os outros três estavam na sua folha de pagamento.

TESTAGEM INADEQUADA DE MEDICAMENTOS NOVOS:

Não é suficiente haver apenas dois ensaios controlados por placebo mostrando um efeito. Se o tamanho da amostra for pequeno, todo efeito não se tornará estatisticamente significativo e o medicamento será aprovado.

Ex: antitussígenos – Nos Estados Unidos, medicamentos sem prescrição para tosse e resfriado foram usados em 39% dos lares durante três anos.

Ex: o único grande ensaio de tolbutamida (tratamento de DM2) conduzido foi interrompido de forma prematura devido a um excesso de mortes cardiovasculares, e como aqueles pacientes que tomaram a maioria de suas doses diárias também eram aqueles que tiveram a taxa mais elevada do evento. Mas a FDA nunca exigiu que a Upjohn tirasse a tolbutamida do mercado e realizasse um novo ensaio.

Ex: Um ensaio sobre supressão de arritmia cardíaca (CAST) foi interrompido logo em seu início porque os dois medicamentos ativos, encainida e flecainida, mataram pacientes. No pico de seu uso, no fim da década de 1980, os medicamentos antiarrítmicos estavam provavelmente causando cerca de 50 mil mortes por ano apenas nos Estados Unidos, similar ao total de norte-americanos que morreram na guerra do Vietnã.

Os estudos de pós-comercialização requeridos não são necessariamente ensaios randomizados, alguns são apenas estudos observacionais, que são muito ruins para detectar sinais de dano.

ADVERTÊNCIAS DEMAIS E MEDICAMENTOS DEMAIS:

Tomar uma estatina pode reduzir seu risco de morrer por doença cardíaca, mas também aumentará seu risco de morrer por algumas outras causas. A cerivastatina (Baycol) foi retirada do mercado depois que pacientes tinham morrido devido a dano muscular e insuficiência renal.

Efeitos do Livalo (estatina): aumenta glicemia, lesão hepática, aumento da C, miopatia, rabdomiólise.

“Espera-se que um homem de 65 anos de idade que não fume, que tenha uma pressão sanguínea sistólica de 140 mmHg e um colesterol de 5 mmol/L viverá três meses mais se tomar uma estatina pelo resto de sua vida”.

OBS do autor: O nome químico do medicamento é torcetrapib. Você consegue pronunciar e recordar isso? Uma razão pela qual os nomes químicos, que são inventados pelas empresas farmacêuticas, são tão absurdos é que então os médicos são forçados a usar o nome comercial e, consequentemente, têm menor probabilidade de prescrever um genérico mais barato quando a patente do medicamento expirar.

Polifarmácia: Um estudo sueco de 762 pessoas vivendo em casas geriátricas revelou que:

– 67% tinham recebido prescrição de 10 ou mais medicamentos / remédios

– 1/3 estava em tratamento com três ou mais remédios psicoativos

– ½ recebia antidepressivos ou tranquilizantes

– ⅕ usava anticolinérgicos (p. ex., para incontinência urinária) eram usados

Todos esses medicamentos podem criar incapacidade cognitiva, confusão e quedas, o que acarreta uma mortalidade considerável entre os idosos.

Um ensaio randomizado mostrou que a redução de medicamentos diminuiu tanto a mortalidade como a hospitalização, enquanto um estudo subsequente em 70 pacientes em quem o número de medicamentos foi reduzido de 7,7 para 4,4 por paciente mostrou que 88% relataram uma melhoria global na saúde, e a maioria teve melhora em funções cognitivas.